domingo, 4 de setembro de 2011

PT e o tiro de misericórdia


Publicado em 04/09/2011 por *Rui Martins

Berna (Suiça) - Se não fossem meus amigos e uma vontade inquebrantável de prosseguir a luta pela independência dos emigrantes, já teria secado como minhoca ao sol, no pelourinho ao qual me ataram meus colegas titulares do Conselho de Representantes dos Brasileiros no Exterior, CRBE.

Quatro meses já se foram depois que alguns titulares conspiradores reacionários, dignos da época da ditadura (embora alardeiam serem pela democracia, pelos direitos humanos e pela participação popular) pediram minha expulsão. Imediatamente, meu endereço e-mail foi retirado da lista dos suplentes do CRBE e, sem processo e sem base legal, apesar de eleito por emigrantes na Europa, deixei de existir.

Durante esse período, depois da minha apresentação de defesa enviada ao Itamaraty, não houve nenhum contato pela Subsecretaria-Geral das Comunidades Brasileiras no Exterior para informar, ao menos, no que deu o pedido feito pelo titular Flávio Carvalho, de Barcelona, considerado o autor do texto da petição, com o apoio da titular de Bruxelas, Mônica Pereira, e do titular de Londres, Carlos Mellinguer (o mesmo que há algumas semanas me qualificou de « verme », linguagem empregada pela extrema-direita européia para qualificar os imigrantes) e que foi assinada por alguns titulares « enrolados na farinha », como confessou alguns dias depois, a titular Esther Sanchez, que imaginara se tratar de uma simples advertência.

De maneira não oficial, me chegou aos ouvidos que o embaixador Eduardo Gradilone, assim como a ministra-conselheira Luísa Lopes Ribeiro (que estará em Londres no fim desta semana) e o futuro ministro-conselheiro Aloysio Gomide, teriam informado aos membros do CRBE, que estão sob sua tutela, ser melhor ignorar o pedido de expulsão e deixar como está, pois já foi enorme o desgaste criado.

Desmoralizado e sentindo chegar a hora da verdade, Flávio Carvalho, que dessa maneira abortou uma pretendida carreira política, chegou a publicar um texto de um extraordinário cinismo, que poderia ser assim resumido: « o Rui Martins não podia ser expulso porque nem é titular e tudo não passou de autopromoção »

Como para tudo existe um limite, chegou a hora do Itamaraty informar, a mim e aos emigrantes, se é verdade que o processo administrativo pela minha expulsão terminou com a rejeição do pedido de afastamento ou expulsão feito pelos titulares. E como toda decisão é acompanhada de suas razões, sejam divulgadas as razões dessa rejeição para que não só eu como os emigrantes brasileiros possam ser informados sobre o absurdo pretendido pelos aprendizes de ditadores do CRBE que conseguiram « enrolar » os demais.

É uma questão de direito. Não divulgar o resultado, já que fui intimado a apresentar minha defesa, na expectativa de que o caso seja esquecido, poderia ser interpretado como cumplicidade.

Se os rumores que me chegaram são infundados, que me seja informado como está o processo administrativo (pois deveria durar três meses), porém não posso continuar sendo tratado como excluído e marginalizado, inclusive sem receber os emails recebidos por meus colegas suplentes. Isso constitui abuso de direito e poderá comprometer ainda mais o CRBE. Se no passado, o Itamaraty agiu de maneira discricionária, como na época da Operação Condor, não há mais clima para esse tipo de procedimento nestes nossos dias.

Não se pode expulsar ninguém por divergência de opinião e não se pode adotar a opacidade como procedimento. Exorto nossos tutores a concluírem de forma correta esse curto trajeto de três anos e meio, no qual conduziram os emigrantes, para os quais reivindico hoje a maioridade e o respeito como pessoas juridicamente capazes de se autodirigirem e se autodeterminarem.

Mesmo porque, neste mês, em São Paulo, caberá ao PT, braço forte dentro do governo Dilma, dar o tiro de misericórida no atual moribundo e desprestigiado CRBE.

A luta pela autodeterminação e independência dos emigrantes brasileiros é também do PT e faz parte das conclusões do Encontro do PT em Londres, o IV EPTEX. E isso será apresentado na plenária do congresso nacional do PT, ou seja, já não adianta mais expulsar o suplente que defendia essa bandeira. Existe um Partido defendendo os mesmos princípios o que muda completamente a situação. É o tiro de misericórdia no CRBE.

Se não confiram e leiam um dos importantes itens aprovados pelo EPTEX:

-       Que o CRBE seja um órgão independente e desvinculado organicamente do Ministério das Relações Exteriores.

Outra decisão importante coincide com nossa luta desde 2008, quando obtivemos um abaixo-assinado na  I Conferência Brasileiros no Mundo em favor de uma Comissão de Transição para uma Secretaria de Estado dos Emigrantes. Reunidos em Londres, no fim de maio, os emigrantes petistas aprovaram:

-       Que seja criada uma Secretaria Especial de apoio aos brasileiros e brasileiras no exterior, responsável pelo encaminhamento das políticas públicas formuladas pela Conferência. Essa Secretaria deverá ter uma atuação transversal, trabalhando em conjunto com os Serviços Consulares e com as Secretarias e Ministérios com atribuições relacionadas aos brasileiros e brasileiras que trabalham, estudam e vivem no exterior.

Já existe no Parlamento, uma proposta nesse sentido, atualmente parada numa gaveta, mas que poderá ser rapidamente aprovada com o apoio dos senadores e deputados do PT.

O mesmo EPTEX aprovou um novo formato no lugar das atuais Conferências Brasileiros no Mundo, que deverá ser convocado diretamente pelo governo federal e não ser mais propriedade exclusiva do MRE-Itamaraty. O que nos deixa a impressão de que realmente não haverá uma IV Conferência Brasileiros no Mundo, mas uma I Conferência dos Emigrantes, organizada por emigrantes e que concretizará a Comissão de Transição:

-       O governo brasileiro constituirá a comissão organizadora da Conferência que terá como atribuição definir os locais, países ou grupos de países onde serão realizadas as Conferências das etapas intermediárias; elaborar o regimento interno e as orientações gerais para todas as etapas que antecederem a Conferência final; e acompanhar a organização das mesmas.

Os petistas do Exterior também condenaram as fraudes ocorridas nas eleições do atual CRBE e propõem medidas concretas para evitar novas fraudes no novo Conselho independente do Itamaraty. A questão do funcionário do Consulado de Barcelona, eleito titular do CRBE e minimizada pelo Itamaraty, mereceu também uma recomendação do EPTEX :

-        Que o Tribunal Superior Eleitoral organize as eleições, estabelecendo um regulamento específico para a votação do Conselho de Representantes dos Brasileiros no Exterior. Este regulamento deve levar em conta as preocupações referentes à candidatura de funcionários locais de representações do governo brasileiro, de modo a evitar que estes tenham qualquer tipo de benefício no processo eleitoral em detrimento aos demais candidatos.

Na I Conferência Brasileiros no Mundo, o abaixo-assinado pedindo a Comissão de Transição incluía o pedido de voto por correspondência para os emigrantes residentes longe de consulados e embaixadas e a necessidade da eleição de parlamentares emigrantes. O PT do Exterior também chegou a conclusões parecidas no IV EPTEX, em Londres:

-       Que o governo brasileiro amplie o direito de voto dos brasileiros e brasileiras residentes no exterior, tornando possível a estes brasileiros eleger e serem eleitos para o Parlamento brasileiro. Que haja uma melhoria no recadastramento eleitoral e consular, sobretudo no que se refere à transferência do título de eleitor.

Agora se trata de uma simples questão de meses, porque o tema emigrantes, Secretaria de Estado dos Emigrantes, parlamentares emigrantes logo estará na atualidade e nos jornais.

Para os emigrantes brasileiros que residem na região de Nova Iorque e Boston, graças ao colega Eddy, Edirson Paiva, do Brazilian Times Newspaper, teremos a oportunidade de levar uma palestra com debate aberto sobre CRBE e Secretaria de Estado dos Emigrantes. Divulgaremos datas e horários na próxima quarta-feira ou domingo.

*Rui Martins – Berna, Suiça - jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura, é líder emigrante, ex-membro eleito no primeiro conselho de emigrantes junto ao Itamaraty. Criou os movimentos Brasileirinhos Apátridas e Estado dos Emigrantes, vive em Berna, na Suíça. Escreve para o Expresso, de Lisboa, Correio do Brasil e agência BrPress.

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