domingo, 10 de novembro de 2013

Uma nova revolução fermenta na França?

7/11/2013, The Saker, Blog The Vineyard of the Saker
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu

Alain Soral e Dieudonne M'bala M'bala
Começo hoje uma série de artigos sobre o que creio que seja a crise extremamente profunda pela qual passa a Europa e sobre o potencial dessa crise para resultar em alguns eventos cataclísmicos. Começo por dar uma olhada ao que se passa na França, provavelmente o país que mais bem conheço e, também, um dos que, me parece, tem grande potencial para gerar uma explosão com consequências de longo alcance.

Pode-se considerar a situação econômica e financeira da França (catastrófica), ou os muitos problemas sociais que assolam a já muito frustrada população francesa, mas quero focar um aspecto específico da atual crise francesa: a amplíssima distância que separa a maioria da população, de um lado, e as elites governantes, de outro, e que ilustrarei com caso muito eloquente: a crescente histeria que acometeu as elites francesas, por causa de um filósofo – Alain Soral – e um comediante de show de piadas, um stand-up comedian – Dieudonne M'bala M'bala.

Já escrevi sobre essas pessoas notáveis [1] [2] [3] e vocês devem ler aqueles artigos para fazerem um quadro melhor do que está acontecendo agora. Para os que realmente não queiram ler páginas antigas, começo pela seguinte mini-introdução.

Dieudonne M'bala M'bala  é franco-camaronês e era, de longe, o cômico mais popular na França, até que fez um pequeno sketch sobre um colono israelense religioso, na televisão francesa. A cena nem foi particularmente engraçada, mas enfureceu, realmente enfureceu, o equivalente francês do AIPAC-EUA – que na França se chama Comissão de Relações Israel-França, CRIF – e que começou uma campanha sistemática para silenciar “Dieudo” [pr. /Diô-dô/] como é conhecido na França. Dieudo recusou-se a encolher-se e retaliou, fazendo piada dos que o estavam perseguindo, o que o converteu em ídolo dos muitos que odeiam as elites financeiras que governam a França desde 1969. Hoje, já completamente banido de todos os veículos da imprensa-empresa em todo o país, Dieudo ainda é o cômico mais popular na França.

Alain Soral é autor e filósofo francês, cuja carreira política incluiu uma filiação ao Partido Comunista Francês e à Frente Nacional. Credita-se a ele o desenvolvimento do conceito de “esquerda do trabalho/direita dos valores” [orig. gauche du travail - droite des valeurs], que se pode resumir como a defesa, simultânea, de ideias e medidas sociais/socialistas nas questões econômicas e sociais, combinadas com moral, ética e valores éticos e religiosos conservadores nas questões ideológicas, éticas e culturais. É fundador de um movimento interessante chamado “Igualdade e Reconciliação” [orig. Égalité et Reconciliation], que visa a reconciliar o povo nativo francês (chamado français de souche [francês de raiz]) e o povo francês recentemente imigrado para a França (chamado français de branche [francês de galho, ou de ramagem]) e fazê-los coexistir em completa igualdade. 

Igualdade e Reconciliação (Égalité & Réconciliation)
Por causa de suas inúmeras ideias “politicamente incorretas” e declarações sem meias palavras, Soral é absolutamente odiado e temido pela classe governante na França. Embora Soral também tenha sido completamente banido de todos os veículos da imprensa-empresa, continua a ser imensamente popular entre o público em geral e seus livros são todos best-sellers.

Soral e Dieudo são pessoas muito diferentes, têm backgrounds muito diferentes e diferentes personalidades. Tempo houve, até, em que foram críticos ferozes um do outro. Mas então as elites francesas decidiram destruí-los, ambos; e eles, então se aproximaram e hoje são bons amigos e apoiam-se mutuamente. Resultado disso, temos esse fenômeno realmente bizarro: um filósofo branco e um comediante negro tornaram-se, unidos, uma espécie de Emmanuel Goldstein [4] de duas cabeças da França moderna: as elites os odeiam e a imprensa-empresa entrou num frenesi tipo “dois minutos de ódio” [5] orwelliano, para convencer o povo francês de que Soral e/ou Dieudo são quase uma reencarnação de Adolf Hitler. Desnecessário dizer que é ideia tão estúpida, que Dieudo vive a fazer piadas sobre ela em seus shows, enquanto Soral a ridiculariza em seus livros e a usa para demonstrar que a França é governada por uma elite minúscula de felásdaputa pervertidos e arrogantes.

Verdade seja dita: tem-se de admitir que as elites francesas enfrentam, neles, dois inimigos formidáveis. Dieudonne é realmente um dos comediantes mais talentosos de todo o cenário francês; e Soral é, sem dúvida possível, o filósofo mais original e brilhante que a França conheceu desde a 2ª Guerra Mundial. Além do mais, a lei francesa torna muito difícil banir completamente um show ou um livro. Deus sabe o quanto as elites francesas tentara. Ambos, Dieudo e Soral, foram várias vezes processados por “racismo” e “antissemitismo”; ambos foram fisicamente agredidos por bandidos da Liga de Defesa dos Judeus (LDJ); e ambos são seguidamente acossados pelas autoridades (versões francesas do FBI e Segurança Nacional dos EUA). Já bem claramente, a campanha de perseguição saiu pela culatra e já assegurou a Dieudo e Soral status (bem merecido) de mártires. Para concluir, Dieudo e Soral revelaram-se usuários altamente sofisticados da Internet, onde seus shows, eventos especiais, entrevistas, livros, eventos mensais tornaram-se altamente populares e vistos por muitos milhões de pessoas, na França e em todo o planeta de língua francesa.

Gradualmente, Soral e Dieudo construíram um movimento político real, ativo no front da internet e das questões internacionais.

Como já disse, o movimento “Igualdade e Reconciliação”, “E&R” defende plena aceitação e total integração dos imigrantes muçulmanos, na sociedade francesa. É crucialmente importante, porque, diferente do que prega a Frente Nacional, E&R não advoga pela expulsão de todos os imigrantes para bem longe da França. E mais, porque E&R também rejeita a ideia de que os imigrantes sejam qualquer verdadeiro problema. Claro, E&R não nega que o desemprego seja altíssimo na França, nem nega que alta porcentagem do crime e violência na França sejam cometidos por imigrantes, mas vê a coisa como efeito de erros políticos que vêm sendo cometidos há muito tempo, não como causa dos problemas da França.

Assim também, o movimento E&R é aberta e declaradamente pró-muçulmanos. Não em algum sentido religioso, porque a maioria dos membros de E&R não são gente muito religiosa, mas, mais, no sentido cultural.

E&R vê o Islã e o Catolicismo Romano francês como duas fontes de civilização, ética e moralidade, seja alguém religioso ou não, e deixa que cada um decida sobre a teologia dessas religiões. É muito diferente do absolutamente estéril “diálogo ecumênico” que procura encontrar ensinamentos comuns a Jesus Cristo e ao Profeta Maomé, ao mesmo tempo em que desesperadamente tenta não ver e não deixar ver as diferenças reais e profundas entre as duas teologias. E&R fala de uma instância comum em muitas, se não em todas, as questões que os franceses muçulmanos e os franceses cristãos enfrentam. E isso faz perfeito sentido.

Pensem no seguinte: islamismo e cristianismo opõem-se declaradamente aos valores do capitalismo, da maximização dos lucros, da especulação, à usura, à imoralidade sexual, à destruição da família tribal tradicional, ao imperialismo, etc.. Ainda que as raízes teológicas do Islã e do Cristianismo sejam diferentes, praticamente todos os seus ensinamentos éticos filosóficos são muito semelhantes. Francamente, só me ocorre uma diferença considerável, e tem a ver com visões fundamentalmente diferentes que muçulmanos e cristãos têm sobre a pena de morte. Mas a pena de morte foi abolida na França em 1981 e, hoje, essa diferença já praticamente nada significa.

Evidentemente, o Cristianismo e o Islã têm seus desvios perversos, sejam as políticas plutocráticas genocidas do Papado no passado, sejam os wahabistas comedores de fígados que o mundo enfrenta hoje, mas E&R consegue facilmente rejeitá-los e condená-los. Do lado dos cristãos, E&R advoga um tipo de catolicismo romano popular que havia na França pré-revolução de 1789 e que pouco tem a ver com os piores excessos do Papado. Do lado dos muçulmanos, E&R mantém-se sempre bem próximo dos ensinamentos de Sheikh Imran Hosein e de Sayyed Hassan Nasrallah. São também próximos do Centre Zahra em Paris, mantido por iranianos. Eu diria que os muçulmanos atraídos para o movimento E&R são do mesmo tipo que os cristãos que o movimento atrái: politicamente progressistas, religiosos convictos, praticantes, mas tolerantes.

Desnecessário dizer que o potencial desse movimento radicalmente novo é imenso, porque une esquerda e direita; cristãos e muçulmanos; religiosos e seculares (desde que não sejam ateístas militantes); nativos e imigrantes; brancos e negros; ricos e pobres.

Mas o que parece realmente detonar o pânico entre as elites francesas é a profunda penetração que o movimento obtém nos notórios “banlieues” franceses, nas periferias das cidades, nos subúrbios pobres e destituídos de tudo, e que, ao longo das últimas décadas, encheram-se de imigrantes africanos, e que se converteram em áreas fechadas, inacessíveis, sem lei, onde o crime impera.

Para entender esse fenômeno, é crucial entender que o crime na França NÃO É, eu disse “NÃO É”, produto dos novos ou antigos emigrados, nem dos muçulmanos religiosos. Imigrantes, novos ou antigos, muçulmanos e religiosos têm fortes raízes culturais, familiares, clânicas e estilos de vida que absolutamente não favorecem a vida criminosa. E a miséria, tampouco, tem algo a ver com isso.

Pessoalmente, morei por 20 anos ao lado de uma grande mesquita frequentada por multidões de muçulmanos muito pobres, da África subsaariana, Maghreb, Bálcãs e do Oriente Médio, e posso testemunhar que nunca, nunca, literalmente, nenhuma vez, algum crime foi cometido naquela área por pessoas que frequentavam aquela mesquita. Bem ao contrário disso, aqueles muçulmanos religiosos que frequentavam a mesquita eram muito mais bem educados, mais corteses, mais gentis, que os locais.

De fato, era bem visível que aquelas pessoas dedicavam-se, atenta e empenhadamente, a mostrar aos locais (sempre assustados à primeira vista, nos primeiros contatos) que não havia por que temê-las. O pior “crime” que cometiam regularmente era estacionar os carros na esquina, mas, isso, porque não havia onde estacionar os carros. E, ao final de cada Mês Santo do Ramadan, os muçulmanos convidavam todo o bairro para celebrar com eles, para provar os pratos deliciosos que ofereciam, e para visitar a mesquita. Dizer que aqueles muçulmanos são cidadãos perfeitos ainda é dizer muito pouco.

O chamado “crime muçulmano” na França é sempre conectado às gangues de segunda geração, de jovens, que perderam as raízes culturais e religiosas e sabem pouco ou nada sobre elas hoje, e que, simultaneamente, são rejeitados pela população local de franceses nativos. Como Soral gosta de dizer “ninguém sai da mesquita diretamente para um surto de estupro em gangue”. É uma coisa ou outra, não as duas. Soral chama esses bandidos de “Islamo-racaille”(fr.), expressão que pode ser traduzida por “islamo-gangues” [orig. “Islamo-thugs”] – tipos horríveis, perigosos, sem noção de certo e errado, e que exteriorizam sua alienação atacando os franceses nativos que eles odeiam. São os tipos que sentem profunda atração pela brutalidade crua do wahabismo e acabam matando policiais na França ou se unem aos comedores de fígado humano na Síria. Neles, o “Islã” não passa de pretexto, de justificativa pia para o banditismo psicopático. Suspeito que muitos Cruzados medievais tinham exatamente esse perfil psicológico.

Muitos jovens imigrantes estão, é claro, em algum ponto entre o tipo “família e religioso praticante” e o tipo “fora-da-lei sem noção”. E, pela primeira vez, um movimento político relevante oferece a eles uma opção muito atraente, o E&R.

Na essência, E&R diz a eles “em vez de não ser nem uma coisa nem outra, seja as duas – seja muçulmano e francês; não odeie os nativos que sofrem a mesma opressão que vocês sofrem e que são os melhores amigos e aliados de vocês; nossos inimigos querem nos jogar uns contra outros, para melhor nos controlar; temos portanto de nos unir e nos manter juntos”. Essa é mensagem nova e original.

No passado, só dois movimentos encararam abertamente a questão da imigração. Por um lado, tinha-se a Frente Nacional, que pregava políticas como a “preferência nacional” (melhores leis sociais e trabalhistas só para os nativos); “tolerância zero” com o crime (mais polícia, leis mais duras, cadeias cada vez maiores e mais lotadas) e a expulsão de todos os imigrantes (exceto talvez os que tivessem passaporte francês, mas até isso era controvertido). Do outro lado, havia uma organização criada pelo Partido Socialista chamada “SOS Racismo”, que abertamente pregava que os imigrantes rejeitassem a cultura local francesa; os imigrantes, sob o slogan bem-soante de “direito de ser diferente”, eram induzidos a odiar os nativos e a exigir que a sociedade francesa aceitasse integralmente suas culturas de origem. Ao longo de 20 anos, as “griffes” da Frente Nacional e de SOS Racismo só fizeram agravar cada dia mais, infinitamente, a questão da imigração na França. O mais recente e particularmente horrível desenvolvimento nessa linha de disputa foi a nova linha política que está sendo promovida pelas elites francesas.

As mesmas elites que há 20 anos criaram e financiaram clandestinamente o movimento SOS Racismo e seu ridículo slogan “Não toque no meu amigo” [orig. “Touche pas a mon pote], declara agora que os muçulmanos, sim, de fato, são problema grave. Enquanto, no passado, essas elites sistematicamente ridicularizaram o cristianismo, hoje dizem que “o Islã não é compatível com a República”. Quanto aos jovens nas periferias [nas banlieues], são hoje pintados como terroristas em potencial, em “células dormentes” da al-Qaeda.

Resultado disso, quando as elites francesas não estão ocupadas com legalizar casamentos homoafetivos, estão ocupadas proibindo o véu nas escolas e reclamando de excesso de carnes halal [tratadas como prescreve a lei da Xaria (NTs)] nos açougues. E, embora apenas uma mínima porcentagem de mulheres muçulmanas na França andem veladas pelas ruas, as elites francesas agora proibiram oficialmente a burqa e o niqab em lugares públicos. Bem evidentemente, os imigrantes muçulmanos na França foram degradados, de “companheiros”, para inimigos.

Contra tudo isso, mais e mais jovens imigrantes voam em bandos para o movimento de Soral, Dieudonne e E&R, cuja popularidade cresce rapidamente. Recentemente, aconteceu algo realmente incrível, que seria impensável há poucos anos.

Em um de seus sketches, Dieudo cantou uma música intitulada “Shoananas”, trocadilho com as palavras Shoah (do hebraico HaShoah, “desastre”, palavra pela qual os judeus franceses frequentemente designam o holocausto de judeus) e ananás [fr. “abacaxi”]. Imediatamente, como era de esperar, o CRIF, o SOS Racismo e outras organizações processaram Dieudo por “incitação ao ódio”. Dieudo foi condenado a pagar multa de 20 mil euros, e apelou contra a condenação. No dia em que Dieudo apresentava sua apelação ao tribunal, aconteceu uma coisa absolutamente extraordinária.

Encontrei dois vídeos em YouTube que mostram o evento e que colo nessa página, porque é alta a probabilidade de que um, ou os dois, sejam retirados da rede (pessoal, baixem logo, enquanto dá!). Aí estão eles:

Versão curta:

Versão mais longa:

Para os que não entendem francês, resumo o que aí acontece.

Elementos da Liga de Defesa dos Judeus (LDJ) apareceram no tribunal para gritar insultos contra Dieudo e seus apoiadores, os quais revidaram gritando insultos contra elementos da LDJ, ao mesmo tempo em que jogam abacaxis contra eles, cantando “Shoananas”. Os policiais faziam o que podiam para manter os dois blocos separados. De repente, os apoiadores de Dieudo começaram a cantar “liberdade de expressão” [fr. liberte d'expression], ao que os apoiadores da LDJ responderam com gritos de “am Israel hai” (“Israel vive”, em hebraico) e começaram a cantar o hino nacional de Israel. Nessa altura, os apoiadores de Dieudo começaram a cantar “A Marselhesa”, a plenos pulmões, canto que imediatamente sobrepujou a voz dos ativistas da Liga de Defesa dos Judeus.

Mas... examinem melhor os rostos que cantam “A Marselhesa”: conseguem ver que muitos, ali, são mulatos e negros? São, precisamente, os jovens vindos sobretudo, embora não exclusivamente, das famosas “periferias”. Bem poderiam ser, exatamente, os mesmos que, em 2001 e 2002 vaiavam o Hino Nacional da França quando era executado nos campos de futebol (o que causou imenso escândalo, à época).

“A Marselhesa” é primeiro e sobretudo, um canto revolucionário, e quando aparece muito mais berrado que cantado por multidões de pobres de punhos erguidos, é claro que se está diante de desenvolvimento muito, muito, muito sério. Desnecessário dizer que nada disso foi “notícia” na imprensa-empresa francesa. Mas pode-se apostar que as elites viram tudo aquilo. E é fácil imaginar o medo que aquelas imagens lhes inspiraram.

Coincidência ou não, quando os policiais ouviram aquela multidão a cantar “A Marselhesa” aos gritos, imediatamente começaram a tirar os ativistas da LDJ de dentro do prédio do Tribunal. Nem chega a surpreender, se se considera a imensa popularidade de que gozam Dieudo e Soral entre os quadros das várias corporações uniformizadas na França (adiante, mais sobre isso).

Alguma coisa de muito importante e de muito novo está acontecendo na França.

O paradigma tradicional de Direita x Esquerda está ruindo, dentre outros motivos, no mínimo, porque a “Direita” oficial e a “Esquerda” oficial já são praticamente idênticas, indistinguíveis uma da outra.

Simultaneamente, o fenômeno E&R vai-se tornando não apenas maior, mas mais profundo. Mais e mais jovens franceses olham para trás, para a história da França desde 1945 e vão aos poucos dando-se conta de que o país tem sido governado por um bando de plutocratas arrogantes que derrubaram de Gaulle em 1968 e que substituíram um notável líder nacional por um protege da família Rothschild, Georges Pompidou, que começou sua carreira como diretor do Banco Rothschild e que, adiante, foi escolhido pelas elites francesas para substituir de Gaulle.

A plutocracia francesa a qual, associada à CIA, orquestrou clandestinamente os eventos do “Maio de 68”, para fazer a “mudança de regime” na França, passou a ter rédea solta para mudar radicalmente a via política “soberanista” traçada por de Gaulle.

Alguém aí adivinha quando começou a política de importar mão de obra barata para a França? Com Pompidou, precisamente, é claro! Agora, graças ao movimento E&R, ambos, os pobres nativos franceses e os pobres imigrantes estão redescobrindo sua história comum e começam a compreender que os dois grupos foram vítimas das mesmas políticas.

Enquanto isso, o regime governante comete uma estupidez depois de outra. A mais recente é simultaneamente muito engraçada e muito séria. Trata-se do imenso escândalo em torno da quenelle.

Quenelle de brochet au sauce Nantua
Originalmente, a quenelle era um prato francês que, se bem preparado, pode ser delicioso. Cozida no formato de bastão, a [palavra] quenelle há muito tempo ganhou outro significado, de gíria. Digamos que a expressão em francês “meto-lhe uma quenelle” tem similares em várias línguas, facilmente compreensíveis.

Dieudo e a "quenelle"
Dieudonne provavelmente não percebeu as complexas consequências que adviriam de suas palavras, quando passou a referir-se repetidamente em suas piadas, ao regime governante, como “uma quenelle”. Para enfatizar, Dieudo passou a mostrar, com os braços, os vários tamanhos de “quenelles” que ele, ou seus apoiadores, estavam “metendo” nas elites. As pequenas, como ele mostrava, mediam um palmo; as grandes, as realmente bem-sucedidas, mediam o comprimento de um braço esticado. Na imagem ao lado, vê-se Dieudo mostrando exatamente o comprimento da tal quenelle.

Essa imagem tornou-se viral e converteu-se rapidamente em meme de Internet e mais e mais pessoas adotaram o gesto, como signo de algo como “f*der o sistema”, “enrabar o governo” ou “aqui p’rá você, presidente [Hollande]!”.

Para piorar, passou a ser uma espécie de esporte nacional aproximar-se de políticos conhecidos e tirar uma foto ao lado dele, fazendo o gesto da quenelle. Apareciam quenelles por todos os cantos, sobretudo quando alguém conseguia fotografar-se ao lado de alguém do governo.

Na foto que se vê logo abaixo, aparece o ministro francês do Interior, Manuel Valls, sionista pervertido, que pregou abertamente a repressão violenta contra Dieudonne e Soral, em discurso ao Congresso do Partido Socialista. Valls é o idiota imbecil sorridente que nada percebeu e aparece no centro da foto, cercado de jovens franceses que lhe “dão a quenelle”. Desnecessário dizer que, quando a foto foi divulgada, o país explodiu em gargalhadas, o que só fez aumentar a fama da “quenelle”.

Manuel Valls levou suas "quenelles"
A Liga Contra o Racismo e o Antissemitismo da França declarou que a quenelle era “uma saudação nazista invertida, usada como símbolo da sodomização das vítimas do Shoah”. Sério! Como seria de prever, a internet francesa ribombou de gargalhadas.

O governo não achou graça nenhuma e reagiu com a paranoia típica dos Stalins e Saddams Husseins: literalmente, lançou uma caça às bruxas para “detectar”quenelles mais explícitas ou menos, e onde e quando alguma foi “detectada”, tentou punir os responsável no caso de ser funcionário público, sobretudo entre policiais e militares. Simultaneamente, a internet foi inundada de todo o tipo de gente a fazer quenelles e desafiar a ira do regime.

Dieudo, claro, convocou militares e soldados uniformizados para seu teatro em Paris, para encenarem, todos juntos, uma quenelle cênica, ao lado do astro. E criou uma página na internet exclusivamente dedicada a fotos de pessoas em uniforme, a fazer quenelles. A página esteve em Les Quenelles [mas já não está no ar (NTs)].

Apoiem nossos irmãos "queneleiros"
Agora, o governo francês já não sabe o que fazer, perdido e confuso. Por um lado, é simplesmente impossível processar todas as pessoas que são mostradas na prática do gesto; é impossível, até, processar todos os policiais e militares uniformizados que alguém viu a fazer a quenelle. De início, o comandante do Exército exigiu “sanções exemplares” contra os dois primeiros soldados que fizeram uma quenelle à frente de uma sinagoga onde estavam de guarda; mas, agora, tem de punir legiões e legiões de soldados que insistem em repetir o gesto, a maioria dos quais, seja por qual motivo for, odeiam o governo. Por outro lado, como o governo francês pode ignorar o fato de que está sendo abertamente desafiado e ridicularizado nas ruas?

Assim afinal chegamos a um tópico cuja importância não há como superestimar; um tema que, mais importante, simplesmente não há:como se pode promover mudança de regime, numa democracia que já foi completamente subornada, comprada e paga, por uma plutocracia?

Soldados “quenelleiros” se encontram na estrada...
Essa é questão absolutamente crucial para a França, tanto quanto para os EUA, o Reino Unido e qualquer outro país da União Europeia; e a resposta a ela parece escapar sempre aos milhões de pessoas no Ocidente que vivem absolutamente desgostosas com o regime que as governa, mas não veem qualquer via realista para mudar tudo.

A violência, claramente, não é opção. O regime já foi suficientemente esperto para classificar qualquer forma de “ação direta” como “terrorismo”, ao mesmo tempo em que criou um monstruoso estado-espião que já superou, em muito, a Securitate de Ceausescu. Se você jogar um tijolo, que seja, contra uma autoridade, ela o rotula de terrorista e o mete na cadeia por décadas.

Entrar no jogo eleitoral é perda de tempo. Os plutocratas são proprietários da imprensa-empresa, a qual, erguida sobre os ombros de publicitários do quilate de Edward Bernays já aprendeu a impor lavagem cerebral a vastas populações, muito mais eficientemente do que Hitler ou Kim Il-Sung jamais conseguiram. Basicamente, como se viu na Assembleia do Estado de Washington, EUA, ontem (6/11/2013), [6] todas as eleições são compradas. É isso. Ponto. Parágrafo. A ideia de “um homem um voto” já foi substituída por “um dólar um voto”.

Tentar convencer pessoas por campanhas regulares de informação também já está provado que não funciona. Quem precise ainda de argumentos, considere as mentiras que o movimento “Verdade sobre o 11/9” descobriu, desmontou e comprovou além de qualquer dúvida razoável – as Torres Gêmeas e o prédio WTC7 foram derrubados por demolição controlada. E essas provas tiveram impacto ZERO sobre o processo político nos EUA. – Isso prova que a maioria das pessoas já foram zumbificadas além do ponto de salvação, ou entregaram os pontos, destruídas pela esperança nenhuma e por desgosto e desespero totais.

Mesmo assim, nós, as pessoas “comuns”, temos, sim, ainda, uma arma formidável: podemos demonstrar nossa total falta de respeito por governos que não nos respeitam e por seus valores. Como Dieudo, podemos rir deles. Deus sabe o quanto todos andamos precisados de uma boa gargalhada! Podemos rir muito, se manifestarmos nosso completo desprezo pelas instituições que o estado tanto se esforça para nos obrigar a respeitar.

Para começar, temos de rir e fazer rir da voz do poder – a imprensa-empresa. – E temos de rir e fazer rir de toda a liturgia do poder – as eleições.

Mas não podemos fazer só isso, porque esse é só o primeiro passo. Em seguida, seguindo o exemplo de Dieudo e Soral temos de usar cada oportunidade que haja para manifestar abertamente nosso total desprezo por qualquer coisa ou instituição que mostre reverência aos governos da plutocracia e aos seus valores. Não só isso, mas temos também de denunciar todos esses propagandistas como “panacas pagos pelo regime” – exatamente o que eles são. Por fim, temos de forçar o regime a mostrar sua verdadeira cara, obrigando-o a agir contra nós.

O humor tem papel crucial nesse processo, porque – pelo menos por hora – ainda não foi declarado ilegal. O humor também é arma valiosíssima para atacar a legitimidade do regime. Aqui, penso nos muitos quadros que o falecido George Carlin apresentou, sobre o governo dos EUA, como os que se vêem a seguir (em inglês):


Carlin era brilhante, mas não teve a excepcional oportunidade que Dieudo e Soral estão tendo hoje, com devastador sucesso: hoje há uma ampla porcentagem da população que já está, não só muito distanciada do poder que a governa, mas, também, que tem os fundamentos para ousar considerar outro modelo: falo, é claro, dos imigrantes muçulmanos na França.

Louis Farrakhan
Sim, os EUA tem a “Nação do Islã”, com líder muito interessante, Louis Farrakhan. Mas o problema com a Nação do Islã é que seus ensinamentos não são verdadeiramente islâmicos, o que os mantém separados do resto do vasto mundo islâmico. Além disso, desde o assassinato de Malcolm X por dois ativistas da Nação do Islã, suspeito que todo o movimento esteja irrecuperavelmente invadido por espiões do FBI.

Mas na França a comunidade islâmica tem ligação muito mais orgânica com o mundo islâmico, inclusive com países como o Irã, que promove visão muito mais refinada e sofisticada das falhas da sociedade ocidental contemporânea que qualquer das mesquitas pró-governo na França e em todo o mundo, ou que os wahabistas.

É irônico, sim, que o francês, que por tantos anos viu a imigração muçulmana para seu país como uma maldição, esteja começando, lentamente, a perceber que pode ter sido, isso sim, uma bênção.

Não quero pintar quadro róseo do Islã na França: há muitos problemas a resolver, tanto para os franceses nativos como para os imigrantes, e algumas formas do Islã não são provavelmente compatíveis com as tradições e a cultura originais francesas. E, sim, há muitos sinais de que a situação que hoje fermenta pode explodir, mais dia menos dia. Mas o fenômeno Dieudo-Soral-E&R dá-me esperanças de que a explosão não tenha de ser destrutiva, que pode ser explosão libertadora.

O que é garantido, para mim, é que acontecerá alguma explosão. Não só se a França chegar à completa ruína, mas porque o regime governante hoje perde a legitimidade, literalmente, dia a dia. Se chegar a ser confrontado, e há real possibilidade de que aconteça na França, não é absolutamente assegurado que a polícia e as forças de segurança permanecerão leais à plutocracia governante, a qual, bem feitas as contas, só fez tornar ainda muito pior do que antes a vida dos policiais regulares.

Pierre Jovanovic
Posso facilmente imaginar um “feriado bancário” que se converte em levante violento e, depois, tudo pode acontecer. Um dos mais notáveis observadores da cena francesa, o economista e autor Pierre Jovanovic, entende que o presidente François Hollande não conseguirá sequer chegar ao fim de seu mandato.

Ora, é claro que não espero que Dieudo ou Soral tornem-se presidente ou primeiro-ministro, nem que o movimento E&R converta-se em grande partido político (para começar, seus criadores não registraram o movimento como partido político). Não se trata disso. Espero, isso sim, que esse movimento contribua para uma redefinição da cena política francesa e crie uma força suficiente para virar de cabeça para baixo o atual establishment do poder, coisa que não se vê desde Maio de 1968 (a Frente Nacional, cuja ascensão foi secretamente ajudada pelos socialistas franceses, para dividir a direita francesa, há muito tempo já foi cooptada pelo sistema).

Considerando as profundas crises sistêmicas e estruturais em que se debate hoje a Europa, a França poderia dar o exemplo e o primeiro passo, se por mais não for, porque os problemas da França não são muito diferentes dos problemas que atormentam o resto da Europa ocidental.

[assina] The Saker




Notas de rodapé




[4] Emmanuel Goldstein é personagem de 1984, de George Orwell. É o inimigo n. 1 do estado, segundo o Partido. É apresentado como o cabeça de uma organização misteriosa  anti-partido chamada “A Fraternidade” (que talvez seja fictícia); e é autor de um livro: “Teoria e Prática do Coletivismo Oligárquico”. Embora seja elemento chave da trama, só é visto e ouvido numa tela e talvez, de fato, não passe de útil criação de propaganda do Ministério da Verdade [NTs]

[5] Dois minutos de ódio também é ideia de 1964 de George Orwell; é um período diário, durante o qual o Partido e a sociedade de Oceania têm de assistir a um filme que mostra os inimigos do Partido (quase sempre Emmanuel Goldstein e seus seguidores) e devem manifestar seu ódio contra eles. Uma espécie de “coluna do Jabor”, da rede Globo, contra o governo da presidenta Dilma do Brasil [NTs]



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