sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Obama puxa, Putin empurra

2/12/2014, [*] MK BhadrakumarIndian Punchline
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu


Se se sabe que o adversário tem força seis, e você tem força quatro, se os dois se põem a empurrar-se um contra o outro, o seu quatro muito provavelmente perde para o seis dele. Lição básica de como usar as forças no judô ensina que se você não puxar, mas empurrar, quando o adversário puxa, você consegue somar os seus quatro aos seis dele e, com força de dez, você facilmente derruba o outro.

O presidente da Rússia e mestre de judô Vladimir Putin (vídeo acima), com certeza sabe muito bem disso e “usou a força” de seu adversário, o presidente Barack Obama dos EUA, contra o próprio, com a surpreendente decisão de pôr fim ao projeto de construção do gasoduto Ramo Sul.

O Ramo Sul, de US$ 40 bilhões, financiado pela Gazprom, levaria gás russo, por baixo do Mar Negro até a Bulgária e dali para o sudeste da Europa. Putin fez o anúncio durante visita a Ancara:

Considerando a posição da Comissão Europeia, que não contribui para a realização desse projeto [Ramo Sul]; considerando o fato de que só recentemente recebemos a autorização das respectivas organizações nos Países Baixos (...) Considerando o fato que nós ainda não recebemos o consentimento da Bulgária, entendemos que, nas atuais condições, a Rússia não pode insistir na realização desse projeto.

Gasoduto Ramo Sul (South Stream) CANCELADO

À primeira vista, parece que Moscou se teria “retirado”, considerada a atitude “forte” da Comissão Europeia pressionada pelos EUA, para não aumentar a sua dependência do suprimento de energia russa. Mas, na verdade, Putin passou a perna no “ocidente”. Na mesma ocasião, Putin disse que:

Passaremos a redirecionar o fluxo de nosso gás para outras regiões do mundo (...). Adiantaremos aos outros mercados, e a Europa não receberá esses volumes de gás, não, pelo menos, da Rússia. Entendemos que não é o que mais completamente satisfaz os interesses econômicos da Europa e que arranha nossa cooperação. Não é escolha russa: é escolha de nossos amigos europeus.

Em resumo, a Rússia mandou para o estaleiro o Ramo Sul, mas nem por isso deixará de vender gás para a Europa, via Turquia, e nada há que a Comissão Europeia (ou Washington) possa fazer sobre o assunto, se os países do sul da Europa preferirem engajar-se no portal de energia que a Rússia planeja criar na fronteira entre Turquia e Grécia.

A parte surpreendente é que a Turquia está firmando uma parceria com a Rússiaapesar de todas as diferenças entre os dois países na questão da Síria. Claramente, a Turquia já afirmara política externa independente, ao recusar-se a adotar as sanções ocidentais contra a Rússia. Moscou gostou de ver que, sob o governo do Primeiro-Ministro Recep Erdogan, a Turquia optara por política externa nacionalista autônoma, e pela emancipação frente aos EUA.

Turquia e Rússia fecham acordo milionário de gás (1/12/2014)
Claro que o entendimento estratégico entre turcos e russos tem vastas implicações para a política regional. Washington não gostou do que está acontecendo, como o comprova esse comentário sardônico na RFERL.

O fim do Ramo Sul comprova, mais uma vez, que Putin está decidido a diversificar os mercados para exportação da energia russa. Os mercados asiáticos tornaram-se agora alta prioridade para as exportações russas de energia.

A Índia deve extrair disso tudo as necessárias conclusões e explorar seriamente as possibilidades de, como está fazendo a China, também se beneficiar do atual “pivô para a Ásia”, mas dos russos. Putin estará em Nova Delhi dia 11/12/2014: é excelente oportunidade para fazer um salto quântico energético, na cooperação entre os dois países.
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[*] MK Bhadrakumar foi diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão, Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Oriente Médio, Afeganistão e Paquistão e escreve sobre temas de geopolítica, de energia e de segurança para várias publicações, dentre as quais The Hindu e Ásia Times Online, Al Jazeera, Counterpunch, Information Clearing House, e muita outras. Anima o blog Indian Punchline no sítio Rediff BLOGS. É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista, tradutor e militante de Kerala, Índia.

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